Até esta seção, consideramos apenas ativos financeiros negociáveis, tais como ações e títulos. No entanto, é importante ressaltar que uma parcela significativa da carteira de ativos do investidor típico é o capital humano, bem como a propriedade de imóveis residenciais que o investidor possui e onde vive. Nesse sentido, o modelo de otimização de média variância pode ser adaptado de forma a incorporar esses tipos de ativos em sua análise.
No caso de investidores que possuem empregos estáveis, com salários consistentes que aumentam com a inflação, podemos modelar os fluxos de caixa associados com capital humano, os futuros salários, como um vínculo de inflação. Já no caso de indivíduos com salários menos certos e rendas com maior volatilidade, poderíamos modelar seu capital humano como uma mistura de títulos ligados à inflação, ações e títulos corporativos. Ao incluir essa fonte de valor econômico na carteira do investidor, aumenta-se a capacidade do indivíduo de assumir risco adicional.
Os imóveis residenciais de propriedade do investidor podem ser tratados de forma semelhante, isto é, como entradas de retorno e risco estimadas a partir de um índice de propriedade de imóveis residenciais para a região geográfica do investidor. A atribuição para a propriedade deve ser restrita a seu valor atual em percentagem do total da sua carteira.
Vejamos como tratar da alocação de ativos relativos à responsabilidade. É preciso abordar a relação entre o portfólio de ativos e os passivos que o investidor pagará utilizando o fluxo de caixa dos seus investimentos. Imagine uma situação que envolva investidores institucionais, tais como fundos de pensões, empresas de seguros e bancos. Os três possuem passivos que devem ser pagos em algum ponto no futuro, sendo que enfrentam rigorosas normas regulamentares e penalidades pelo não cumprimento dessas obrigações.
Como exemplo, considere um plano de pensão de benefício definido para ilustrar as principais questões e conhecer algumas definições. Existem dois componentes de um plano de pensão de benefício definido:
- a responsabilidade de pensão; e
- a carteira de investimentos que é gerenciada para satisfazer os requisitos de fluxo de caixa do passivo.
Um plano de previdência promete um fluxo de pagamentos na aposentadoria, o qual geralmente depende de quanto tempo o empregado trabalhou para a empresa, bem como do seu salário nos últimos anos antes da aposentadoria de trabalhadores. A responsabilidade do fundo de pensão representa o valor presente, calculado à taxa de desconto apropriada, dessas obrigações de aposentadoria futura do plano.
O excedente do plano e a razão de financiamento são calculados da seguinte forma:
EP = VMA – VPRP
RF = VMA / VPP
Em que:
- EP é o excedente do plano;
- VMA é o valor de mercado dos ativos da carteira de investimento;
- VPRP é o valor presente das responsabilidades com pensões;
- RF representa a razão de financiamento; e
- VPP é o valor presente dos passivos.
O plano de previdência será totalmente financiado se a razão de financiamento for igual a 1, o que significa que o excedente do plano será zero. Um plano subfinanciado apresenta uma razão de financiamento inferior a 1. As características do passivo do fundo de pensão devem dirigir as exigências de retorno, o risco da carteira de investimento e, por fim, a decisão de alocação de ativos. A análise deve reconhecer que o valor dos ativos e dos passivos são conduzidos por alguns fatores em comum, de forma que as correlações entre alterações no valor de ambos são importantes.
As seguintes características de passivos são relevantes para a decisão de alocação de ativos:
- Passivo fixo versus contingente: o passivo fixo apresenta fluxos de caixa, cuja quantia e a data são especificadas com antecedência, como uma debênture de taxa fixa; os passivos contingentes, por sua vez, têm fluxos de caixa que dependem de eventos futuros incertos, tais como a responsabilidade de pensão associada a um plano de pensões definido;
- Obrigações legais contra quase legais: obrigações legais são obrigações definidas em um acordo legal; já as obrigações quase legais não são obrigações legais, mas constituem parte do fluxo de caixa esperado, sendo essenciais para a missão da instituição (e.g., doações de universidades podem ser consideradas passivos quase legais);
- Duration e convexidade: medem a mudança no valor de um passivo para uma determinada alteração nas taxas de juros, sendo que duração e convexidade são geralmente referidas em relação aos títulos de renda fixa, mas o conceito pode ser aplicado a qualquer ativo;
- Valor de responsabilidade versus tamanho do patrimônio da organização: uma grande responsabilidade em relação ao tamanho da organização patrocinadora necessariamente precisa ser contabilizada na decisão de alocação de ativos;
- Fatores que afetam os fluxos de caixa futuros: incluem a inflação, taxas de juros, prêmios de risco e outras condições econômicas, sendo que as obrigações do plano de pensão de benefício definido são influenciadas pela escolha da taxa de desconto;
- Sincronismo: considerações de sincronismo entre recebimentos e pagamentos, incluindo o risco da longevidade no caso dos fundos de pensão; e
- Regulamentações: características que afetam a determinação do valor da responsabilidade, tipicamente encontradas no setor de seguros.